sexta-feira, 7 de agosto de 2015

Nos mínimos detalhes

Reproduzimos o excelente artigo do professor e economista Alcimar Chagas, em parceria com o economista Cláudio Marouvo, disponível em: (http://www.coneflu.com/#!Uma-contribui%E7%E3o-argumentativa-para-a-discuss%E3o-sobre-a-recomposi%E7%E3o-das-receitas-p%FAblicas-na-rota-do-petr%F3leo-fluminense/c236q/55bfd39a0cf285bbf304083e)sobre os riscos da VENDA DO FUTURO. O artigo, reproduzido faz uma abordagem técnica sobre o tema tratando de forma responsável o alerta à população sobre as operações financeiras que poderão levar o município a uma situação crítica a médio e longo prazos, assim, por sua linguagem acessível, permite a reflexão e a manifestação de todos através das assinaturas na campanha Royalties: NÃO VENDA MEU FUTURO, liderada por nós do Observatório. Nesta nova fase, as assinaturas poderão ser feitas através do formulário disponível (http://www.observatoriocampos.blogspot.com.br/2015/07/seja-voce-tambem-um-colaborador.html ), que pode ser baixado, impresso e assinado - na quantidade desejada - e posteriormente entregue no térreo do Edifício Ninho das Águias, loja da ACIC, no térreo. Ou através de contato com o nosso e-mail: observatoriocampos@gmail.com

Vale à pena a leitura e o compartilhamento:

Uma Contribuição Argumentativa para a

Discussão sobre a Recomposição das Receitas 

Públicas na Rota do Petróleo Fluminense

August 3, 2015
Alcimar das Chagas Ribeiro (economista, D. Sc., pequisador da UENF); Claudio de Carvalho Marouvo (economista , Ms. Sc.)

A proposta relativa à operação financeira para recomposição das receitas dos municípios produtores de petróleo, aprovada pelo Congresso Nacional, e com franca discussão em Campos dos Goytacazes, precisa de justificativas técnicas e não políticas para a viabilidade de sua implementação. O argumento dos interessados na engenharia financeira é simplista, quando afirmam que não se trata de vender o futuro do município. Afirmam que a emissão de títulos públicos lastreados em royalties na bolsa de Nova York não trará implicações negativas para o próximo governante, além de não gerar dificuldades de caixa, já que o comprometimento é de somente 10% da arrecadação futura. Ainda como benefício os municípios em crise financeira, por conta da queda do preço internacional do petróleo, poderão evitar a paralisação de serviços importantes nas áreas de saúde, educação, saneamento, transporte, dentre outras, que estão sob o risco de suspensão.

Especificamente sobre a operação financeira, a mídia tem divulgado a necessidade de recomposição das receitas para equilíbrio das contas do município, numa perspectiva em torno de R$1,0 bilhão em 2015. Neste caso é importante entender que o uso de poupança de terceiros (empréstimos) implica na absorção de custos (juros) que variam segundo o grau de confiança do tomador (Município de Campos). Neste caso o país passa por dificuldades, já que teve o seu grau de investimento reduzido da perspectiva estável para negativa pela agência Standard & Poor's (S&P). Nas últimas semanas, o país tem sofrido com a fuga de investidores de seus ativos, fato definidor da perda do selo de bom pagador. Por outro lado, é real a fuga dos investidores dos mercados emergentes em direção aos países ricos e o Brasil é o que mais sofre entre os emergentes. Assim, a expectativa de alto deságio no valor de face dos títulos públicos dos municípios representará, de fato, um custo muito elevado que cairá sobre os ombros dos munícipes e que deverá ser pago pelo próximo governo.

Uma segunda questão que merece ser tratada é relativa ao descontrole das contas públicas, em função da queda do preço internacional do petróleo. Segundo os gestores públicos, eles foram surpreendidos com a queda abrupta da transferência das rendas de petróleo, o que implicou na descontinuidade de contratos fundamentais em favor da população. Base da justificativa para a recomposição da receita orçamentária.

Neste caso, é importante lembrar que a Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101 - 04/05/2000) foi flexibilizada, permitindo a antecipação de receitas futuras por conta da crise econômica. Entretanto, as regras orientadoras do equilíbrio das contas públicas, a exemplo do planejamento, envolvendo as receitas e as despesas, estão mantidas. É obrigação do gestor público, manter um padrão de excelência no planejamento fiscal em cada exercício. Ai está o grande gargalo! Técnicas de planejamento parecem não fazer parte do "cardápio" da gestão pública municipal.

Em uma avaliação temporal, podemos observar que as transferências de renda do petróleo para o caixa do município de Campos dos Goytacazes vêm caindo desde 2013.  Nesse ano, a receita retraiu 2,55% em relação ao ano anterior e em 2014 a queda foi de 1,79% em relação a 2013. No contexto da conjuntura macroeconômica, os fundamentos também vêm se deteriorando há alguns anos, em função da recessão mundial, posterior à crise americana de 2008. O saldo da Balança Comercial saiu de US$40,0 bilhões superavitário em 2007, para US$3,9 bilhões deficitário em 2014. No primeiro semestre de 2015 o saldo foi superavitário em US$4,5 bilhões.

Outro aspecto importante e responsável pelo enfraquecimento da conjuntura nacional foi a deterioração dos preços das commodities no mercado internacional. O preço do minério de ferro se desvalorizou em 64,2% em junho de 2015 em relação a junho de 2012, enquanto o preço do açúcar desvalorizou 39,5% no mesmo período.

Consequentemente, vimos desacelerar fortemente a geração de emprego. Em 2010 o país gerou um saldo de 2,1 milhões de empregos, enquanto o Rio de Janeiro gerou um saldo de 190,6 mil empregos. Em 2014 o país gerou um saldo de 152,7 mil empregos e o Rio de Janeiro gerou um saldo de 34,7 mil empregos. No primeiro semestre de 2015 o saldo foi negativo. Ou seja, o País eliminou 389,5 mil empregos, enquanto o Rio de Janeiro eliminou 80,0 mil empregos.

Fica evidente, portanto, que a crise não aconteceu de repente. A mesma vem se desenrolando em um processo, cujo marco fundamental é a crise financeira nos Estados Unidos no final de 2007. Neste caso, os gestores públicos que projetam os seus gastos em função da previsão de receitas futuras, deveriam com cautela ir ajustando as suas contas. Contrariamente, imaginaram que o crescimento das receitas de royalties estaria garantido e não mediram esforços em ampliar a estrutura pública, com terceirização de contratos de toda natureza e uma grande pitada de ineficiência na gestão dos recursos oriundos de transferência constitucional.

Como evidências claras da presente situação, basta um exame sobre alguns indicadores econômicos internos ao município. Por exemplo, o município tinha uma participação de 2,27% no total do emprego do estado em 2004, a qual caiu para 2,14% em 2013. Em relação ao Valor Adicionado Fiscal, indicador de dinâmica econômica municipal, o município apresentou uma participação de 3,11% do valor total do estado em 2004, evoluindo levemente para 3,22% quase dez anos depois, mesmo na condição de produtor de petróleo e com um orçamento na casa R$2,4 bilhões em 2014.

A renda média do trabalho assalariado no município está em torno de 2,5 salários mínimos, caracterizando uma forte concentração. O relatório da RAIS de 2013 mostra que 36,34% da renda do trabalho estão concentrados no setor de administração pública e 27,56% no setor de serviços. Se considerarmos ainda o comércio com 18,24%, podemos afirmar que 82,14% da renda do salário no município são oriundos de atividades não industriais, com baixo padrão de conhecimento e, consequentemente, baixos salários. O setor industrial é responsável somente por 6,53% da renda, representando um grande problema, já que a indústria de transformação gera riqueza e estrutura cadeias produtivas essenciais para a dinâmica do setor econômico.

Como podemos observar não se evidenciou uma preocupação dos gestores públicos com o planejamento de médio e longo prazos. Os resultados da crise econômica foram se materializando no tempo e não de repente. Nesse caso, faltou eficiência na leitura da conjuntura econômica nacional e sobraram iniciativas populistas e absorvedoras de grandes volumes de recursos alocados no curto prazo, já que a taxa média de investimento, considerando somente os recursos de royalties e participações especiais, no período de 2007 a 2013, se situaram no nível de 31,53%, sendo o restante de 68,47% gastos em custeio.

Assim, de acordo com a presente contextualização, reafirmamos que a alternativa à crise deveria ser canalizada para o ajuste nas despesas. Uma melhor gestão orçamentária eliminaria algumas despesas não prioritárias, não necessitando da recomposição das receitas, via empréstimos, e que levará o município, mantida a tendência de estagnação da economia brasileira, a uma situação insustentável de liquidez para honrar seus compromissos nos próximos anos. Sobrará uma herança "maldita" para os próximos governos!

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